A regulamentação da atividade de agenciamento esportivo no projeto de Lei Geral do Esporte
- Convidado
- 24 de abr. de 2017
- 4 min de leitura

*Texto selecionado entre os cinco melhores no I Concurso de Miniartigos organizado no Facebook.
Uma atividade muito importante no esporte é a atividade de agenciamento esportivo. Os profissionais que exercem essa atividade, os intermediários ou agentes, são responsáveis pelas negociações envolvendo atletas e entidades de prática de esporte, bem como atletas e patrocinadores, podendo atuar como representante de qualquer um dos lados em uma tratativa.
Atualmente, não há regulamentação estatal da matéria, cabendo às entidades de administração do esporte, em consonância com o princípio da autonomia das entidades esportivas, previsto no art. 217, I, da Constituição Federal de 1988, regular o tema.
Essa situação pode mudar. Isso porque o Projeto de Lei Geral do Esporte, apresentado neste mês no Senado Federal (ressalta-se que o anteprojeto foi apresentado em novembro a essa Casa Legislativa por uma comissão de juristas), traz a regulamentação estatal da matéria.
No presente artigo, pretende-se fazer um breve estudo dos dispositivos do projeto de lei que visam a regular a matéria, cotejando-os com os artigos do Regulamento Nacional de Intermediários da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que regula o tema no âmbito do futebol, o que será feito nas próximas linhas.
Logo no artigo 1o do Regulamento Nacional de Intermediários da CBF, é trazida uma definição de intermediário, in verbis:
Art. 1o - Considera-se Intermediário, para fins deste Regulamento, toda pessoa física ou jurídica que atue como representante de jogadores, técnicos de futebol e/ou de clubes, seja gratuitamente, seja mediante o pagamento de remuneração, com o intuito de negociar ou renegociar a celebração, alteração ou renovação de contratos de trabalho, de formação desportiva e/ou de transferência de jogadores.
O Projeto traz a conceituação legal de agente esportivo, outra forma de se referir ao intermediário, no caput do art. 92:
Art. 92. Entende-se por agente esportivo a pessoa natural ou jurídica que exerça a atividade de intermediação, ocasional ou permanente, na celebração de contratos esportivos e no agenciamento de carreiras de atletas.
Percebe-se que não há uma diferença substancial nos conceitos apresentados pelos dispositivos citados, havendo apenas um maior nível de detalhamento na conceituação apresentada pelo Regulamento Nacional de Intermediários da CBF, que especifica as pessoas que podem ser representadas por esses profissionais, a saber, clubes, atletas e técnicos, e as atividades que eles exercem, quais sejam, negociação ou renegociação de celebração, alteração ou renovação de contratos de trabalho, de formação esportiva e/ou transferência de jogadores.
O parágrafo primeiro do art. 92 do Projeto preceitua que o agente esportivo somente poderá atuar se devidamente licenciado pela organização esportiva de âmbito nacional que regula a modalidade esportiva em que pretende atuar ou federação internacional respectiva, no caso do futebol, a CBF e FIFA (Fédération Internationale de Football Association), respectivamente.
Nesse ponto, o dispositivo do Projeto está em consonância com os art. 10, que exige o registro na CBF para o exercício da atividade, e o art. 37, que veda o uso de serviços de intermediários não licenciados na Confederação por parte de clubes, atletas e técnicos, ambos do Regulamento Nacional de Intermediários da CBF. A diferença é que o art. 37 do regulamento direciona a proibição aos clubes, atletas e técnicos, enquanto que o art. 92, § 1o, do Projeto a direciona diretamente aos agentes.
Um ponto conflitante entre os dois diplomas normativos em cotejo diz respeito ao disposto no parágrafo terceiro do art. 92 do Projeto, que excepciona a regra da necessidade de licenciamento para atuar como intermediário para parentes de primeiro grau, cônjuge e advogado dos atletas, ao passo que o Regulamento da CBF não excepcionou a regra do licenciamento.
Tal conflito necessita ser estudado e debatido profundamente, para ver qual norma prevalecerá, algo muito além das possibilidades deste breve estudo. Cumpre apenas destacar que a solução não é impor a norma estatal, haja vista o princípio constitucional da autonomia das entidades de prática esportiva (art. 217, I). É realmente necessário um profundo debate acerca do tema.
A respeito da possibilidade de um mesmo intermediário representar as duas partes em uma mesma operação, tanto o art. 92, § 3o, do Projeto de Lei Geral do Esporte quanto o art. 27 do Regulamento Nacional de Intermediários condicionaram a representação dupla a acordo prévio e por escrito, no qual seja definido qual das partes será responsável pela remuneração do agente.
Na esteira do art. 12, III, do Regulamento, o parágrafo segundo do art. 92 do Projeto preceitua que o contrato de intermediação ou agenciamento esportivo (no Regulamento chamado de contrato de representação), instrumento por meio do qual um atleta, um clube ou um técnico constitui alguém como seu agente, não poderá ter validado superior a dois anos, nem ser prorrogado automaticamente.
Por fim, destaca-se que o parágrafo quinto do artigo 92 do Projeto prevê a fiscalização do exercício da profissão de agente pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social, no intuito de coibir a prática das funções a ela inerentes por pessoas não autorizadas. Trata-se de um reforço na fiscalização, já que a entidade de administração de esporte também se encarrega de tal mister, o que dificultará ainda mais o exercício irregular do ofício.
Conclui-se desta breve análise que o projeto de Lei Geral do Esporte traz uma regulamentação genérica e sucinta do tema, dando espaço às entidades de administração de esporte para complementar a legislação estatal. Em casos de conflito entre as suas normas e as emanadas dos entes de organização do esporte, como no caso do parágrafo terceiro do art. 92 e o Regulamento Nacional de Intermediários da CBF, é preciso um amplo debate para se determinar qual norma prevalecerá, sempre tendo em mente o princípio constitucional da autonomia das entidades esportivas (art. 217, I) e os seus limites.
João Paulo Alves Pinto
Advogado, formado pela Universidade Federal de Goiás e pós graduando em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Damásio. Membro Associado do Instituto Goiano de Direito Desportivo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>>. Acesso em: 26 mar. 2017.
CBF. Regulamento Nacional de Intermediários (2017). Disponível em:
<http://cdn.cbf.com.br/content/201702/20170201154734_0.pdf>. Acesso em: 26 mar. 2017.
BRASIL. Anteprojeto de Lei Geral do Esporte. Disponível em: <http://www19.senado.gov.br/sdleg-getter/public/getDocument?docverid=f6a8faec-768f-4ece-85e5-c75b21e59cad%3B1.1> Acesso em: 26 mar. 2017.
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